segunda-feira, 27 de abril de 2009

O ARTESÃO

José Roberto Del Valle Gaspar*

Quando viajamos nesses ônibus que fazem trajetos entre nossas cidades interioranas, ouvimos muitas histórias ou estórias pitorescas e engraçadas, às vezes sérias, mas contadas de modo simples.
De Muzambinho partem para Cabo Verde, Botelhos, Poços de Caldas...; Monte Belo, Areado, Alfenas....; Guaxupé, Guaranésia, Arceburgo...; Juruaia, Nova Resende.... e outros trajetos.
Certa vez, estava eu indo para Poços de Caldas num “busão” desses, e, após Botelhos, entra um senhor com algumas sacolas, trajando roupas simples e com um bonezinho no alto da cabeça. Procura um lugar vago, e, apesar de ter vários, incomoda uma senhora que está com suas malas em cima do banco ao seu lado. Esta, com toda delicadeza, tira seus pertences e o senhor se senta, se ajeita, dá uma olhada em volta, depois se fixa em um rapaz que está no banco do outro lado do corredor. Após algum tempo o reconhece e pergunta:
- Cume qui tá... eu num tava te cunheceno... cê tá diferente...!
O moço responde:
- É..., o senhor tem razão, já deve fazer uns deis anos mais ou menos que a gente não se encontra!
Aí a conversa continua.
- Si num fais, tá ranhano isso!
- E o Jorge, o que ele tá fazendo?
- Ah! O Jorge foi jogar futibol na fazenda canelinha, hoje é dia santo mêmo, tem muita gente que guarda...os padre transfiriro pro domingo mais próximo!...
- E o Miguel?
- O Miguel tá em casa, num sei cumo ele num foi atrais do Jorge, ele gosta de vê ele jogá!
- O senhor vem aqui todos os dias?
- Não! as veis eu fico em Poços a semana intera!
- Continua mexendo com taquara?
- É... tamém, deis dos oito ano qui eu trabaio cum taquara, praticamente!, fazeno balaio e cesta!
- Sempre que eu passo de ônibus eu vejo o senhor trabalhando!
- Ce já viu vinte e um balaio de taquara trançada e rematada dentro de uma caixa de fósforo!!??
- Não!!??
- Puis é, ninguém acridita, si tivé aqui na minha sacola, vô te mostrá!
O senhor tirou um bauzinho de taquara de dentro da sacola, por sinal, muito bem feito, e de dentro deste tirou uma caixa de fósforos.
- Aqui, dá uma oiada!
O rapaz abriu a caixinha e comprovou que realmente haviam vinte e um balaios, em miniatura, bem elaborados, então pedi para dar uma olhada e confirmei.
- Viu... tamém si num vê num dá prá acriditá mêmo né, tem gente que aposta que é mintira!... e vem de longe comprová!
A senhora que estava do lado também olhou e ficou admirada não só com os pequenos balaios, más também com o bauzinho em forma de duas peneirinhas, uma sobre a outra.
O homem era um habilidoso artesão, apesar da sua simplicidade.
Nesses casos é que vemos que a arte muitas vezes advém de pessoas tão simples, que nem sequer sabem o que é ser artesão e muito menos que o resultado do seu trabalho é arte.

*Autor (Publicado no jornal "A Folha Regional" em 31/12/2008)

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